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Os falsos romances na internet que se tornam pesadelos financeiros
Uma história cinematográfica veio à tona
nesta terça-feira na Inglaterra. Enquanto o mundo comemorava o dia de
São Valentim – o equivalente ao nosso Dia dos Namorados – o tabloide
Daily Mail publicava uma reportagem sobre uma mulher de 59 anos que foi
enganada por um falso namorado que conhecera pela internet, e acabou por
entregar ao estelionatário suas economias da vida inteira.
Vicky Fowkes conheceu em um site de
relacionamentos um suposto engenheiro civil que dizia se chamar John
Hawkins. O homem dizia ser sul-africano e viver na Inglaterra, mas
estaria na Nigéria a trabalho. A certa altura, Hawkins disse que
retornaria à Inglaterra e que poderia encontrar Vicky. Porém, teria sido
impedido de sair da Nigéria por dever impostos. O falsário pediu,
então, ajuda à vítima, que entregou de bandeja 40.000 libras, o
equivalente a pouco mais de 100.000 reais.
Esse tipo de golpe é bastante comum no
Reino Unido. De acordo com a reportagem do Daily Mail, um estudo da
Universidade de Leicester constatou que cerca de 200.000 pessoas já
foram enganadas em namoros virtuais. Os valores entregues a título de
ajuda ao falso namorado ou namorada variaram de 50 a mais de 275.000
libras.
Mas não é só em terras britânicas que
ocorre o golpe do namoro pela internet. Esquemas como o que vitimou
Vicky são aplicados em todo mundo, e a história do sujeito que está em
terras estrangeiras e precisa de ajuda financeira é largamente aplicada.
O Brasil mesmo já teve a sua Vicky Fowkes, que, no entanto, entregou
uma quantia bem menor ao bandido.
Em 2009, uma mulher de Belo Horizonte
conheceu pela internet um brasileiro que dizia morar nos Estados Unidos.
Ele pediu dinheiro para comprar sua passagem ao Brasil e, depois, para
custear despesas médicas. No fim das contas, a vítima depositou-lhe
2.900 reais. Quando constatou a fraude, foi à delegacia registrar a
ocorrência. “A moça nem desconfiou do fato de a conta do sujeito ser de
São Paulo”, diz Bruno Tasca Cabral, delegado que cuidou do caso à época.
Histórias convincentes
Ao se deparar com uma história desse
tipo, a reação de muita gente pode ser de incredulidade frente à
aparente ingenuidade das vítimas. Mas é bom atentar para o fato de que
muitos dos estelionatários que aplicam esse tipo de golpe muitas vezes
sofisticam suas histórias pessoais para ganhar a confiança da vítima,
que frequentemente está passando por um momento de fragilidade
emocional. Os relatos são tão ricos em detalhes que poderiam virar
roteiros de cinema.
No caso britânico, fraudador e vítima
conversaram durante alguns meses antes que ele pedisse dinheiro pela
primeira vez. Os dois se falavam inclusive por telefone, possibilitando a
Vicky identificar um sotaque sul-africano que ela achou “encantador”.
“Nós conversávamos sobre tudo que existia sob o sol – famílias,
relacionamentos, hobbies, interesses, animais de estimação, nosso
passado. Eu confiava nele completamente”, disse a britânica ao Daily
Mail.
Segundo ela, Hawkins pintou um cenário
rico em detalhes de como seria sua vida na Inglaterra. Enviou-lhe fotos
convincentes – aparentava ter cinquenta e poucos anos – e tinha resposta
para todos os questionamentos de Vicky. Por que ele precisava do
dinheiro dela para pagar o débito com o governo nigeriano? Por que tinha
sido roubado, estava sem seus cartões e, portanto, sem acesso a suas
contas britânicas. Por que não pedia ajuda à família? Porque não queria
alarmar sua mãe. “Para tudo que eu perguntava – como por que a embaixada
não poderia ajudar – ele sempre tinha uma resposta”, disse Vicky ao
jornal.
No Brasil, a mentira do fraudador de
2009 também era rica em detalhes. Após conversar pela internet durante
certo tempo, a vítima se apaixonou pelo falsário, que marcou sua ida ao
Brasil para vê-la. No entanto, alegando estar desempregado, o homem
pediu dinheiro a vítima para a passagem, e forneceu-lhe dados de uma
conta bancária em São Paulo. Na véspera da suposta viagem, ele disse que
não poderia embarcar, pois havia sofrido um acidente de carro.
Para dar veracidade à história, o
estelionatário buscou fotos de acidentes de carro na internet e forjou
imagens de si mesmo ferido, que foram enviadas à moça pelo correio. “Ele
deitou numa cama, se enfaixou todo, maquiou-se para parecer ter um olho
roxo e pôs um canudinho para parecer que estava tomando soro”,
descreveu o delegado. A vítima, então, enviou-lhe mais dinheiro para as
despesas médicas, numa quantia que totalizou 2.900 reais.
“Você jamais deve considerar que está
conversando com a pessoa. Até que você tenha referências suficientes
para checar seu background, não é uma pessoa, são letras e números”, diz
Alexandre Atheniense, advogado especializado em Direito da Tecnologia da Informação que atua em Minas Gerais.
Outros casos
Em ambos os casos, as vítimas só
perceberam o esquema quando já era tarde demais, e foram à polícia fazer
o registro. No caso brasileiro, o bandido foi identificado e o processo
agora corre na Justiça de São Paulo, de onde o fraudador cometeu o
crime. Porém, em fóruns e comunidades da internet não faltam comentários
de pessoas que dizem já ter sofrido tentativas de golpes semelhantes em
sites de relacionamento.
Quase sempre o fraudador diz estar
baseado em um país estrangeiro e precisar de ajuda financeira por algum
motivo mirabolante. Um golpe muito comum, inclusive no Brasil, é o das
supostas russas que tentam extorquir homens que conhecem em sites de
namoro. São estelionatários que usam e-mails e nomes falsos –
Anastasiya, Angelica, Anna Strokova, Elenka Vasilyeva, entre outros -,
enviam fotos de lindas mulheres russas para fisgar suas vítimas e pedem
dinheiro para as mais variadas despesas.
A Nigéria é um país constantemente
mencionado em casos de embustes amorosos, assim como outros países
africanos, como Gana e Serra Leoa. Muitos dos golpistas são de fato
nigerianos e de outras partes da África, mas também há fraudadores em
países como Inglaterra e Canadá.
Não é de hoje que a Nigéria é mencionada
em mensagens de golpistas. Mesmo antes de a internet se popularizar, já
existia o golpe da “carta da Nigéria” – que hoje vem por e-mail – com
uma oferta de emprego na África ou gordas recompensas em dinheiro para
quem depositar, para o remetente, uma determinada quantia. Quem se
dispõe a conversar com o golpista vai se deparar com histórias incríveis
e ricas em detalhes.
Dicas
Fazer amizades e começar namoros pela
internet já é uma realidade. Mas antes de confiar na pessoa com quem
você se corresponde, é preciso checar suas referências virtuais e reais.
“Qualquer golpista evita dar referências presenciais sobre si. Ele vai
tentar conduzir toda a sua interlocução pelo meio eletrônico”, diz Alexandre Atheniense.
O primeiro passo é checar o nome da
pessoa nas redes sociais e nos mecanismos de busca. A falta de
informações é um primeiro sinal de suspeita. Busque também seu e-mail
nos mecanismos de busca para verificar se aquela conta já não foi usada
em golpes anteriores. Existem centenas de sites e fóruns online em que
os internautas alertam sobre golpistas reincidentes.
“Mas não se contente com as referências
virtuais, cheque também referências presenciais”, alerta o advogado.
Verifique se a pessoa realmente trabalha onde diz trabalhar. E se,
depois de um tempo de relacionamento, ela não fornecer um endereço
físico, não embarque. É claro que existem golpistas que chegam a se
relacionar presencialmente com as vítimas para, depois, roubá-las. Mas a
prevenção virtual já evita boa parte dos embustes.
Existem ainda outros elementos que
evidenciam os golpes logo de cara. “São comuns erros de português nesses
e-mails. Se houver, logo no primeiro contato, uma oferta mirabolante
mediante depósito em dinheiro, mesmo que o remetente seja conhecido, é
golpe na certa. Ninguém faz uma abordagem assim tão direta, por melhor
que seja a proposta”, diz Atheniense.
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